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O Trilobíta do Piauí

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Há muito temos discutido sobre as riquezas paleontológicas do Piauí.  Considerado um lugar atrasado e vítima do preconceito bairrista de cidadãos de outros estados, o Piauí abriga uma riqueza de milhões de anos já retratada por nós em outros artigos.  Nosso objeto de análise agora é o Trilobita, um dos elementos marcantes da paleofauna do Piauí.

Mas quem foi ou o que foi o Trilobita?  Esses animais foram invertebrados marinhos que viveram entre 570 e 345 milhões de anos, na Era Paleozóica, entre os períodos Cambriano e Carbonífero.  Existiram cerca de 4.000 espécies das quais apenas uma sobreviveu até o Permiano (último período da Era Paleozóica).  São considerados os ancestrais dos artrópodes (o maior filo do reino animal, atualmente com 1 milhão de espécies).  Seu corpo como o próprio nome diz, é formado por três partes, como a maioria dos artrópodes: cabeça, tórax e o pigídio (os insetos possuem o corpo dividido em cabeça, tórax e abdome).  A Cabeça possuía duas antenas delgadas, um par de olhos compostos dorsais e boca ventral.  O tórax possuía de 2 a 29 segmentos curtos e separados e os finais, devidamente fundidos formam uma cauda (o pigídio).  De acordo com os excelentes registros fósseis, foi possível determinar que estes animais, tal qual os artrópodes, possuíam desenvolvimento indireto com três formas larvais (STORER et al., 1991): o protaspis, o meraspis e o holospis (os insetos holometábolos, como a mosca, por exemplo, apresenta os estágios ovo, larva, pupa e adulto; ou seja, dois estágios larvais entre o ovo e o adulto).  O estágio Holospis era o que o indivíduo apresentava mais características do adulto.  Da primeira forma larval para a última, o número de segmentos ia crescendo, e o exosqueleto (esqueleto externo, uma das principais características dos artrópodes) ia sofrendo mudas ou ecdises (trocas periódicas).  Seu tamanho variava de 10 a 675 mm (dependendo da espécie) e seu habitat era o fundo dos mares.  Algumas espécies eram de vida livre e outras viviam agrupadas.

Os trilobitas constituíram um sub-filo dos Artrópodes, formado por 7 classes: Agnostida, Redlichiida, Corynexochida, Ptychopariida, Phacopida, Lichida e Odontopleurida.  O indivíduos agrupam-se de acordo com as formas de seus lóbulos.  Segundo alguns autores (STORER et al., 1991), estes animais são parentes mais próximos dos crustáceos.  Entretanto, de acordo com outros (MENDES, 1982), a larva protaspis é muito diferente da Nauplios (larva típica dos crustáceos), assemelhando-se, assim com embrião de Limmulus, um merostomado quelicerado, portanto aparentado das aranhas (Sub-filo Chelicerata).

Pesquisando antigos boletins e artigos do Departamento Nacional de Produção Mineral, descobrimos o Boletim nº 135, datado de 1951, e escrito pelo geólogo Wilhelm Kegel, sob o título “Sôbre alguns trilobitas carboníferos do Piauí e do Amazonas”(sic).  O trabalho fala sobre as interpretações estratigráficas de alguns geólogos e paleontólogos da década de 40, enviados pelo Conselho Nacional de Petróleo para analisar amostras coletadas e datadas como do Carbonífero (período consagrado como o da formação dos combustíveis fósseis) na bacia Piauí-Maranhão.  Em 1949, o geólogo V. DEQUECH forneceu dois perfis geológicos, ambos do município de José de Freitas, o 1948-XI (numa pedreira da Fazenda Mocambo) e o 1948-X (numa pedreira da Fazenda Contendas).  Nos dois perfis, distantes entre si cerca de 16 km, destacaram sete camadas.  Os pesquisadores atentaram para as camadas 2 e 6 do perfil 1948-XI.  A camada 2 era formada por sílex e arenitos, recheados de conchas.  A camada 6 era formada por calcário creme, com veios de calcita, e mais fósseis conchíferos.  Na camada 2, V. DEQUECH coletou inúmeros fósseis (especialmente moldes) de uma fauna bastante uniforme.  Os fósseis encontrados eram dos moluscos bivalves Naiadites.  Na camada 6, ao contrário, encontrou-se uma fauna bastante diversificada.  Dentre os animais encontrados estavam os moluscos bivalves Allorisma, Nucula, Astartella, Pleurophorus, Schizodus, Posidoniella e Aviculopecten; o molusco gastrópode Bellerophon; alguns braquiópodes (Productus, Spirifer e Orthothetes) e o molusco cefalópode Orthoceras, além dos trilobitas.

O trilobita do Piauí, como ficou conhecido na bibliografia especializada, foi descrito como uma espécie nova, bastante semelhante a um encontrado na Amazônia, em 1938.  Foram encontrados na perfuração da Fazenda Mocambo 3 cranídeos, alguns fragmentos da cabeça (cranídeos incompletos), meia dúzia de pigídios completos e muitos pigídios incompletos.  A espécie nova foi batizada (classificada) como Phllipsia (Ameura) plummeri.  Em razão da ausência de tórax entre os achados e da aparência com indivíduos dos gêneros Phillipsia e Ameura, o espécimen ganhou termos para gênero e sub-gênero.  O epíteto específico plummeri foi uma homenagem ao geólogo F.B. PLUMMER, que passou muitos anos pesquisando o solo do Piauí.  O trilobita da Amazônia ficou classificado como Phillipsia (Ameura) duartei diferenciando-se de P.(A.) plummeri apenas por ter um pigídio mais achatado e recurvado (é provável que outras diferenças existissem, entretanto somente o pigídio do trilobita amazônico foi encontrado, num argilito do rio Jatapu).  A descoberta do trilobita do Piauí foi importante sob o ponto de vista da busca de petróleo, uma vez que a espécie é pertencente à Classe Ptychopariida, reconhecida como um dos últimos grupos a desaparecer no final da Era Paleozóica (provavelmente no Permiano), e, portanto, recente, caracterizando nosso território como isento de combustíveis fósseis.

Mesmo sem o esperado petróleo, o solo do Piauí revela uma extraordinária riqueza histórico-natural.  Uma riqueza quase ímpar, na paleontologia e arqueologia mundiais.  A paleoflora (Teresina e seus arredores), a paleofauna (José de Freitas e São Raimundo Nonato) e as manifestações humanas - fósseis e pinturas rupestres - (Piripiri/Piracuruca, Caracol e São Raimundo Nonato) mostram para o mundo vários bons motivos para estar e visitar o Piauí.