[Luiz Antonio de Assis Brasil]I- O Autor:Nasceu em Porto Alegre, em 1945. Professor, músico, romancista e novelista. Autor de uma vasta obra, é um dos escritores que mais publicam no Estado e no Brasil.Seus romances, num estilo fluente, focalizam o regionalismo e as origens do povo rio-grandense. Como características: tenta desmistificar os heróis da nossa história - falhas Pressione TAB e depois F para ouvir o conteúdo principal desta tela. Para pular essa leitura pressione TAB e depois F. Para pausar a leitura pressione D (primeira tecla à esquerda do F), para continuar pressione G (primeira tecla à direita do F). Para ir ao menu principal pressione a tecla J e depois F. Pressione F para ouvir essa instrução novamente.
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Concerto Campestre

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[Luiz Antonio de Assis Brasil]

I- O Autor:

Nasceu em Porto Alegre, em 1945. Professor, músico, romancista e novelista. Autor de uma vasta obra, é um dos escritores que mais publicam no Estado e no Brasil.

Seus romances, num estilo fluente, focalizam o regionalismo e as origens do povo rio-grandense. Como características: tenta desmistificar os heróis da nossa história - falhas, fraquezas, mas com momentos de grandeza e, geralmente, a história do RS como pano de fundo.

Portanto, Assis Brasil é um escritor de questionamento da realidade histórica, apresentando-o numa perspectiva crítica.

II- Obra:

Narrativa realista tradicional, do ponto de vista da linguagem e da estrutura da obra.

A história acontece numa fazenda do interior gaúcho, em meados do século XIX. O fazendeiro e charqueador é o Major Antônio Eleutério de Fontes, casado, dois filhos, uma filha, Clara Vitória.

O fazendeiro mantém em sua propriedade rural uma pequena orquestra, vista por alguns de seus vizinhos como uma extravagância absurda, um desperdício de dinheiro.

O livro explica que o Major acumulou recursos contrabandeando gado e vendendo aos dois lados da Guerra dos Farrapos.

Passando por sua fazenda, dois índios missioneiros, músicos, encantaram o Major com seus instrumentos. Interessado, a partir daí, cada vez mais, por música, o Major acaba montando a orquestra, tendo contratado como regente um mineiro conhecido por 'Maestro'. A escolha deste sujeito foi feita a partir da indicação do vigário de São Vicente [povoado próximo à fazenda]: o vigário queria livrar o Maestro de complicações amorosas. A orquestra recebe o nome de Lira Santa Cecília e causa indignação em D. Brígida, esposa do Major.

Todavia, D. Brígida tem como grande preocupação encaminhar o casamento da filha Clara Vitória.

Na propriedade de Antônio Eleutério há um lugar com poderes místicos, o 'boqueirão': trata-se de uma tapera, local ermo e de difícil acesso, que, no entanto, dá excelentes uvas, onde ninguém costuma pisar.

Com o tempo, a Lira Santa Cecília vai ficando famosa: os concertos na fazenda são concorridos, a orquestra vai tocar em Rio Pardo. O Major compra novos uniformes e aumenta o salário dos músicos. Até aqui o livro é quase uma crônica, relatando amenidades e curiosidades.

Eis que aparece o nó da trama: Clara Vitória, a única filha, já encaminhada para o casamento com o Silvestre Pimentel, sobrinho e possível herdeiro de um fazendeiro vizinho que está doente, apaixona-se pelo Maestro. Em retrospectiva, a obra nos mostra Clara Vitória, enquanto posava, mesmo sem vontade, de futura esposa de Silvestre Pimentel, fazia visitas noturnas ao alojamento do Maestro, passava lá a noite, voltando para seu quarto pouco antes do amanhecer.

O segundo elemento em importância da orquestra, um músico velho e experiente, apelidado Rossini, sabe do caso e, amante de óperas, prevê um final operístico para a história.

A tensão da obra aumenta quando Clara se descobre grávida. Vai escondendo de todos enquanto é possível; ao visitar a parteira, vê que não é mais possível interromper a gravidez. Numa audição da orquestra, Clara passa mal. O vigário desconfia, pressiona a menina, ela confessa. O vigário já desconfiava de algo, mas não imaginava que a história envolvesse o Maestro. Chama Silvestre para antecipar o casamento. O noivo topa. Vai à fazenda com a mesma proposta, que é rechaçada de imediato pelo Major. Até que D. Brígida descobre: 'Você está grávida!'.

Segue-se uma consternação na família. D. Brígida dá uma surra em Clara que é protegida pelas criadas. O Major sai para fazer 'o que deve ser feito': justiça. Mas, todos eles - o Major, D. Brígida, os familiares - pensam que o pai da futura criança é o noivo Silvestre Pimentel. O Major vai à casa de Silvestre para matá-lo. Silvestre tenta dialogar, mas o major atira, atingindo o ex-noivo. Volta para casa e avisa D.Brígida que matou o sujeito. Mais tarde, descobre-se que Silvestre apenas ficara ferido. Antônio Eleutério toma as decisões: expulsa Clara Vitória de casa, obrigando-a a viver sozinha no boqueirão; proíbe qualquer pessoa, com exceção do capataz, de aproximar-se do local, mantendo inclusive vigilância armada; não mais permite a citação do nome de Clara na residência.

Em meio a este desenredo familiar, tudo em volta se transtornou. D.Brígida não sabe o que faz da vida; o Major passa os dias solitário, quieto, tendo inclusive desativado a orquestra Lira Santa Cecília. O Maestro, na impossibilidade de ver Clara, abandona a fazenda e vai para Porto Alegre. Seu amigo Rossini ainda faz previsões: 'Ainda não ocorreu o último ato desta ópera. E eu não quero perder'.

O Maestro e Rossini tentam sobreviver em Porto Alegre. Numa noite, abandonando uma ópera no meio do espetáculo, o Maestro pergunta a Rossini, que conhecia o final da história: 'Como termina?'. 'Em casamento', responde o amigo. Enquanto o Maestro angustiava-se em Porto Alegre, sofrendo pela separação de Clara, o Major Antônio Eleutério ia definhando, já perdendo a razão. E Clara vivia solitária, exilada na tapera abandonada, vivendo consigo mesma, com a natureza que a cercava e com imagens do passado, confusas em sua mente. Ajudada somente pela criada, Clara tem seu bebê: é uma menina.

Num momento mágico, o Maestro redescobre a partitura de uma música que compusera para Clara. Toca a peça na missa em Porto Alegre, horrorizando o Bispo, Despedido, retorna com Rossini e os outros músicos à estância do Major. A ressurreição da Lira Santa Cecília reanima o Major. Mas Antônio Eleutério já está definitivamente perturbado. Ordena um concerto no qual ele é o único assistente. Briga com a mulher, que resolve abandoná-lo. Em meio a uma chuva, na presença do vigário, vendo seu mundo desmoronado, suicida-se. O maestro dirige-se ao 'boqueirão'. Rossini aplaude, como se estivesse na plateia de uma ópera. Final feliz:

Ela foi até a margem, tirou a roupa e lavou-se. Estava assim, meio submersa, refrescando-se na delícia da tarde, quando sentiu que alguém vinha em sua direção, atravessando as águas. E logo soube quem era, sempre saberia dali por diante, pelos anos afora: não precisou cobrir-se, nem correr de vergonha, apenas abriu os braços e entregou-se ao primeiro beijo de todos os beijos de sua longa vida.