Deus fez o homem do barro, assim diz a Bíblia, Mestre Vitalino fez do barro os bonecos e acabou dando-lhes vida. Brincando de "ser Deus", concedeu a esta matéria prima um significado diferente, dele fez seu sustento, sua arte, sua glória e, fatalmente, seu declínio. Alguém poderia definir Mestre Vitalino? E suas obras? Populares? Eruditas? Modern Pressione TAB e depois F para ouvir o conteúdo principal desta tela. Para pular essa leitura pressione TAB e depois F. Para pausar a leitura pressione D (primeira tecla à esquerda do F), para continuar pressione G (primeira tecla à direita do F). Para ir ao menu principal pressione a tecla J e depois F. Pressione F para ouvir essa instrução novamente.
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Da lama ao barro do barro à lama

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Deus fez o homem do barro, assim diz a Bíblia, Mestre Vitalino fez do barro os bonecos e acabou dando-lhes vida. Brincando de “ser Deus”, concedeu a esta matéria prima um significado diferente, dele fez seu sustento, sua arte, sua glória e, fatalmente, seu declínio. Alguém poderia definir Mestre Vitalino? E suas obras? Populares? Eruditas? Modernas? Como explicar sua genialidade? Dom? Inspiração?

Ele era o próprio barro, o barro era o Mestre, os dois se fundiram e não dá para falar de um sem se lembrar do outro. Suas obras eram ele, elas denunciaram as alegrias e as tristezas do povo nordestino daquela época, falavam por si só o que o Mestre não sabia dizer com palavras, ironicamente acabou sendo cronista, sociólogo e antropólogo sem nem saber

Não era letrado, nem precisava ser, sua arte o fazia gênio. “Era mais importante que eu aprendesse a usar as mãos que a minha cabeça. Na minha terra as mãos produzem comida e a cabeça só produz confusão”, dizia com simplicidade o artesão.

Outros vieram antes de Vitalino, mas seu dom era divino, suas peças deslumbravam as pessoas. Então o Mestre saiu de sua terra natal Caruaru para o mundo, veio a mídia que lhe deu destaque, mas nas entrelinhas sempre foi mostrado como uma figura exótica, um matuto, um analfabeto pobre. Sua ingenuidade aguçava a ganância daqueles que conheciam o valor de suas obras.

A importância artística do Mestre era tanta, que até Pablo Picasso em sua casa possuía uma de suas obras e John Kennedy uma das suas peças mais conhecidas: o boi de barro. Vitalino fez inúmeras viagens para São Paulo e Rio de Janeiro para apresentar seus trabalhos em diversos museus e outros locais. Até que um dia o fecharam em um quarto e começaram a cobrar ingressos para poderem ver o Mestre moldando o barro, ele acabou virando mercadoria. Foi explorado, usado, humilhado...

Mestre Vitalino morreu em extrema pobreza, numa casa humilde, localizada no bairro do Alto do Moura em Caruaru, hoje o local abriga o museu que leva o seu nome. O motivo de sua morte ainda hoje causa controvérsias. Vitalino deve ter morrido de tristeza, pois Caruaru e o restante do país não souberam dar ao artista o seu valor real e o deixaram morrer a esmo, apagado da memória daqueles que um dia o elevaram ao patamar de estrela, porém, suas obras ficaram, ficaram também para alguns artesãos a sua arte, mesmo que em forma de cópia, isso é o que nos consola.

Elias, amigo, escultor e primeiro discípulo do Mestre, resumiu com palavras simples o que foi a vida de Vitalino Pereira dos Santos: “ Vitalino, teve uma vida Deus tão triste, faz inté pena a gente contá”.