[Aluísio Azevedo]I- Autor: Da infância e adolescência no Maranhão, ficaram algumas influências permanentes na obra de Aluísio Azevedo: A aproxim... Pressione TAB e depois F para ouvir o conteúdo principal desta tela. Para pular essa leitura pressione TAB e depois F. Para pausar a leitura pressione D (primeira tecla à esquerda do F), para continuar pressione G (primeira tecla à direita do F). Para ir ao menu principal pressione a tecla J e depois F. Pressione F para ouvir essa instrução novamente.
Título do artigo:

O Mulato

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por:

[Aluísio Azevedo]

I- Autor:

Da infância e adolescência no Maranhão, ficaram algumas influências permanentes na obra de Aluísio Azevedo:

A aproximação com o falar português, os arcaísmos o lusitanismos, frequentes em O Mulato, O Cortiço etc., decorrem do fato de que o Maranhão era, na época, a mais portuguesa das províncias brasileiras, com fortes resíduos da colonização e permanente intercâmbio com Lisboa; além disso, os pais de Aluísio eram portugueses.

A crítica à hipocrisia da vida provinciana parece também decorrente do fato de que a sociedade conservadora de São Luís hostilizou duramente os pais de Aluísio, que não eram casados e viviam juntos. Em O Mulato, Aluísio parece vingar-se de São Luís.

A técnica do pintor e do caricaturista que Aluísio desenvolveu, posto que sua primeira inclinação foi para as artes plásticas, reflete-se na capacidade de, através da escrita, 'visualizar' rapidamente as personagens e cenas, captando, de imediato, seus traços mais exteriores. Se, por um lado, essa propensão para a caricatura faz as personagens de Aluísio bastante esquemáticas, reduzidas a 'tipos', sem profundidade psicológica, por outro, possibilitou ao autor movimentar em seus romances centenas de tipos, habilitando-o para o romance de coletividade, de multidão.

Aos 19 anos, Aluísio transfere-se para o Rio de Janeiro, onde o irmão Artur de Azevedo já fazia sucesso com suas peças teatrais. Torna-se caricaturista e suas charges políticas apareceram em jornais como O Fígaro, O Mequetrefe, A Semana Ilustrada, Zig-Zag etc. [Consta que, mais tarde, ao abandonar o desenho pela literatura, Aluísio Azevedo manteve o hábito de, antes de escrever seus romances, desenhar e pintar, sobre papelão, as personagens principais mantendo-as em sua mesa de trabalho, enquanto escrevia].

Por ocasião da morte de seu pai, volta a São Luís, onde troca a pintura pelo jornalismo anticlerical. Publica no Maranhão Uma Lágrima de Mulher [ainda romântico] e O Mulato [l881], que provoca verdadeiro escândalo em São Luís [algumas personagens eram conhecidas figuras da sociedade local].

Regressa ao Rio em 1882, quando passa a viver profissionalmente como escritor de folhetins. Foi o nosso primeiro escritor profissional. Mas literatura não era ganha-pão viável. Assim, em 1896, abandona definitivamente a atividade literária, ingressando na carreira diplomática. Até a morte, em 1913, não escreveu absolutamente nada, nem romances, nem folhetins, nem teatro; produziu apenas correspondência diplomática e algumas observações [inéditas] sobre o Japão.

II- Obra:

*OS FOLHETINS ROMANESCOS decorrem da atividade de Aluísio como escritor profissional; têm escasso valor literário e representam meras concessões ao gosto do leitor da época. Escritos sem muito cuidado, para publicação na imprensa diária, o próprio autor reconhecia a fragilidade desses trabalhos:

Uma Lágrima de Mulher, Condessa Véspor, Girândola de Amores, Filomena Borges e A Mortalha de Alzira.

*OS ROMANCES REALISTAS/NATURALISTAS constituem o segmento apreciável da obra de Aluísio Azevedo, ainda que seja um conjunto bastante heterogêneo, com resíduos românticos, documentação realista, experimentação naturalista etc.

O Mulato, Casa de Pensão, O Coruja, O Homem, O Cortiço e O Livro de uma Sogra.

#CONTOS: Demônios e Pegadas.

#TEATRO: A Flor de Lis e Casa de Orates.

#CRÔNICAS: O Touro Negro [póstuma].

III- Resumo:

Após a morte da filha, D. Bárbara, deixa sua fazenda para morar com o genro Manuel Pescada, próspero comerciante, e com a neta Ana Rosa, em São Luís do Maranhão. Enérgica com os escravos, D. Bárbara comanda-os aos berros e sovas, o que muito desagrada Pescada, chegando, algumas vezes, a verbalizar o seu arrependimento em ter concordado com a vinda da sogra.

O irmão de Pescada, José da Silva, fazendeiro e ex-comerciante de escravos, foi assassinado, há muitos anos atrás, em suas terras. Sua esposa, D. Quitéria Inocência de Freitas Santiago já era viúva, sem filhos e muito rica, quando se casou com ele. Embora fosse extremamente religiosa, achava que escravo não era gente e o simples fato de alguém não ser branco, já era um crime. José teve um filho, Raimundo, com uma ex-escrava alforriada de nome Domingas. A atenção que o marido devotava a esse afilhado, fez com que D. Quitéria descobrisse a verdade sobre o menino.

Num ataque histérico, a chibatas e queimaduras a ferro em brasa, a senhora quase mata Domingas. Diante do ocorrido, Quitéria, aconselhada pelo jovem vigário, Padre Diogo, refugia-se na propriedade da mãe. José vai buscá-la, flagrando-a em adultério com o padre. Transtornado, a estrangula, matando-a na frente do sacerdote que, para se livrar do escândalo, sugere a José um pacto de silêncio mútuo; para todos, a esposa teve morte natural e, assim, foi enterrada.

José deixa a fazenda para Domingas e mais três pretos velhos, que já alforriara, e parte para São Luís, onde pretende liquidar seus bens e, em seguida, voltar a Portugal com o filho Raimundo. Ele e o menino hospedam-se na casa do Pescada em São Luís. Mas, logo adoece e, impossibilitado de embarcar, recebe visitas diárias de seu 'fervoroso' amigo, Padre Diogo. Este vai conquistando a amizade da família e quando nasce Ana Rosa, Pescada e esposa escolhem-no para padrinho.

Tendo José se restabelecido, insiste em voltar para a fazenda, mas para o desespero de Domingas, no caminho, bem próximo da casa, é morto em uma emboscada, e Raimundo, o Mundico, sob a guarda do tio, é enviado ao padrinho em Portugal, segundo o desejo paterno.

Após estudar advocacia na Europa, onde se forma em advocacia, Mundico volta à terra natal, para vender as propriedades do pai e se estabelecer no Rio de Janeiro. Excetuando-se os imensos olhos azuis, que herdara do pai, é um tipo acabado de brasileiro: alto, elegante, pele bem morena e fina; pescoço largo e nariz direito; cabelos negros, lustrosos e crespos; dentes claros sob um bigode negro.

Interessado no lucro que teria, auxiliando o sobrinho na venda das terras, Pescada resolve acomodá-lo em sua casa, mesmo sabendo que o mulato no seio de sua família geraria comentários desfavoráveis na sociedade local. Padre Diogo, agora Cônego Diogo, conselheiro da família, concorda com o argumento de Pescada.

O Cônego, que parece ter culpa na morte de José, é, por sua vez, adversário natural de Raimundo. Sentindo-se ameaçado, por temer a descoberta de seu segredo, quer vê-lo bem longe de São Luís. Na casa do tio, Raimundo alheio às histórias envolvendo sua mãe, empenha-se em descobrir os mistérios em torno de seu nascimento e da morte paterna. Acredita que, voltando à fazenda de São Brás, será possível desvendar o passado e reconstruir sua história.

Ana Rosa herda do pai o corpo rijo e os dentes fortes e, da mãe, a beleza das formas, os olhos negros e os cabelos castanhos. Como toda donzela da época, aos quinze anos, já sente as transformações operadas em seu corpo e espírito, ansiando por um marido 'o homem da sua casa, dono de seu corpo, a quem ela pudesse amar abertamente como amante e obedecer em segredo como escrava'.

O pai via no seu empregado português, Luís Dias, muito trabalhador, discreto, econômico e com tino comercial aguçado, as qualidades de um futuro genro. Apesar de tudo isso, o moço, com seu eterno ar de piedade, resignação e humildade espera a decisão da moça. Toda vez que o pai tocava em casamento e sugeria o nome do Dias, ela exclamava um ora, papai!

A convivência com o primo Mundico desperta em Ana Rosa uma grande paixão. Passava o dia pensando nele, idealizando o calor de seu rosto. Numa espécie de embriaguez dormia, ouvindo sua voz, colhendo no ar seus beijos quentes; ao acordar, ficava horas inteiras prostrada, entre os lençóis a cismar.

Raimundo que, por sua vez, ainda não havia reparado na beleza da prima, numa manhã à mesa do café, nota-lhe as mãos claras, os dentes asseados, a frescura pele, a boca e os cabelos fartos. Mas, fica só nisso, devotando-lhe uma afeição e atenção fraterna. Anica torna-se pálida, chamando a atenção de todos. Achavam que tal estado só se curaria com casamento. Padre Diogo e D. Bárbara, que nunca viram com bons olhos a presença do mulato no seio familiar, acham que para acertar o casamento da menina com o Dias, Raimundo deve sair de casa o mais rápido possível. Ana Rosa não quer Luís Dias para esposo e o Pescada, que punha o interesse financeiro acima de tudo, acha que o amigo Diogo estava criando coisas sem fundamento, pois fora o próprio Mundico que sugerira casamento para a prima.

Quando Raimundo saía, Ana Rosa visitava seu quarto e numa bisbilhotice, voluptuosa e doentia, fantasiava eventos com os objetos encontrados; passava momentos inesquecíveis naquela adoração. Raimundo, desconfiando dessas visitas, um dia volta sorrateiramente e flagra a prima com um livro na mão. Repreendendo-a por aquela atitude comprometedora, pede que ela se retire. Depois de muito chorar, a moça declara seu amor ao primo.Num abraço, oferece-lhe os lábios e o rapaz dá-lhe um beijo tímido; em troca, beijá-o duas vezes, ardentemente.

Depois de vários adiamentos, Raimundo e o tio partem para o Rosário e durante a viagem, Mundico conhece um portuguesinho que lhe conta muita coisa acerca da fazenda São Brás e seus moradores. Fica sabendo que o Cônego Diogo tinha sido o pároco da região e muito ligado ao pessoal da fazenda. Além disso, passam pela cruz de madeira, à beira da estrada, marcando o local da morte de seu pai. Os guias não vão além dela, temendo a maldição ali existente.

Tio e sobrinho chegam à fazenda ao anoitecer. O administrador Cancela, que conhecera Raimundo, ainda menino, hospeda-os com alegria. Na manhã seguinte, após as transações comerciais, partem bem cedo para São Brás. Ali, com muita emoção, olhando as datas nas lápides das sepulturas do pai e de D. Quitéria, Raimundo conclui que era filho bastardo.

Como no dia anterior, havia pedido Ana Rosa em casamento e Manuel declinara sem dizer a razão, acha agora que esse seria o motivo. Insiste para que o tio lhe conte a verdade, e este lhe diz que Domingas está viva, e é a velha negra louca, encontrada momentos atrás. Assim, o caso amoroso dele com a prima tornava-se proibido e Ana Rosa afigura-se-lhe uma felicidade indispensável.

Quando o pai conta a Ana Rosa o ocorrido, denigre a imagem do primo e esta tem um ataque histérico. Enquanto isso, Raimundo leva o Cônego Diogo a seu quarto e conta-lhe suas suspeitas. Mas o velho Cônego, num jogo de retórica brilhante, força Raimundo até a lhe pedir desculpas. Diogo desce as escadas entre resmungos: 'Deixa estar, que me pagarás'. Sete dias depois, Raimundo deixa a casa do tio, esperando o dia da partida do vapor para o Rio.

No dia da partida, Manuel e o Cônego se dirigem ao porto para dizer-lhe adeus. Após alguns momentos de indecisão, acerca de sua viagem, Mundico, minutos antes de embarcar, vai ao quarto de Ana Rosa, que o proíbe de sair e terminam fazendo amor, ouvindo, ao longe, o assobio do vapor, partindo. Raimundo resolve instalar-se no Caminho Grande e os amantes, que se comunicam por carta, marcam um dia para a fuga.

O Cônego contava com os préstimos de Dias, com quem se aliara, e este farejava os movimentos e cartas recebidas por Anica, para contar ao padre. Após três meses, o Cônego e Dias descobrem o plano dos amantes e aparecem na hora exata, acompanhados de um juiz. Arma-se um escândalo; Ana Rosa fala de sua gravidez, chocando a todos. O cônego rebate, dizendo que a afilhada continua pura; aquilo era apenas um recurso para forçar o casamento. Diogo aconselha Raimundo a ir embora de São Luís para não ser processado.

Ao sair com Dias, o Cônego parece conspirar; entrega-lhe algo, mas o companheiro escrupuloso se nega a receber. Logo o astuto Cônego convence-o de que estaria vingando sua honra ultrajada e lembra-lhe: 'quem o seu inimigo poupa, nas mãos lhe morre'. Após vagar pela noite, Raimundo resolve voltar para casa e, ao abrir a porta, é atingido pelo revólver de Dias. Mundico, num gemido, tomba contra a parede; vendo-o morto, Ana Rosa aborta. Seis anos depois, ela reaparece, em solenidade pública, bem casada com o Sr. Dias - o assassino de Raimundo. Está preocupada em cuidar dos três filhos e também do marido: 'Agasalha bem o pescoço Lulu! Ainda ontem tossiste tanto à noite, queridinho'.